O GRADUALE SIMPLEX
Para
o renascimento do canto gregoriano, hoje
por
Mons. Alberto Turco
1.
O livro do salmista e da schola
Duas
épocas de composições musicais bem distintas, correspondentes a
duas zonas litúrgicas, caracterizaram o percurso histórico da
liturgia: a época do salmista, desde as suas origens até ao
séc. V inclusive, e a época da schola, do séc. VI em
diante.
A
época do salmista estende-se aos recitativos litúrgicos, que
se originam da ‘cantilação’ e nos quais o uníssono é
predominante. Nos recitativos, o texto é anunciado, declamado e
pontuado, para efeito da sua inteligibilidade.
Os
géneros litúrgico-musicais que se formaram a partir dos recitativos
podemos subdividi-los em leituras, monições, orações, em sentido
lato, salmodia, litania e hino no sentido antigo, sem distinção
entre Missa e Ofício.
Da
ligação entre leitura e canto fala expressamente Santo Agostinho
(354-430) no Sermo 176, 1: «Aprendemos isto da lição
apostólica. Depois, cantámos o salmo, exortando-nos uns aos outros,
a uma só voz e com um só coração, dizendo: Vinde, adoremos».
O
salmo inteiramente cantado pelos participantes da liturgia é um
exemplo de prática executiva da salmodia in directum.
No início, a tarefa de proclamar a leitura com o seu salmo poderia
ser realizada por um único ministro. Neste caso, a salmodia ainda se
caracterizava pela simplicidade da linha melódica. É quanto
aprendemos novamente de Santo Agostinho ao relatar o modo de cantar
do cantor em Alexandria, de acordo com o ‘método’ «que me
lembro de ter ouvido muitas vezes atribuir-se ao bispo alexandrino
Atanásio: ele fazia o leitor recitar salmos com tão leve inflexão
da voz, que mais parecia próxima de uma declamação do que de um
canto” (ver Conf. c. X, 33. 50).
Quanto
à salmodia responsorial, numerosos são os testemunhos. Santo
Atanásio, por exemplo, gabava-se de ter feito a assembleia cantar o
quóniam in sǽculum misericórdia eius:
«Sentado no trono ordenei ao diácono que lesse o salmo e ao povo
que respondesse Porque é eterna a sua misericórdia, e que
todos se retirassem e fossem para casa” (cfr. Patrologia Greca
25, col. 675, n. 265).
Na
sinaxe litúrgica dominical com Eucaristia, o salmo ante
oblationem antes da oferenda, que interessou particularmente a
Santo Agostinho, e o canto 'ordinário' de comunhão, o salmo 33
(Benedícam Dóminum), atestado pela patrística dos séculos
IV e V, eram executados na forma vigente da salmodia, sobretudo
responsorial. Nesta forma, o salmista era encarregado de cantar o
salmo e a assembleia o refrão, geralmente breve e fácil de
recordar.
No
âmbito da salmodia responsorial, vai ganhando sempre mais
consistência uma nova prática de salmodia, alternada entre dois
coros, comummente chamada de antifonia: o
solista homem com um verseto do salmo e o coro dos homens com a
resposta alternam-se com uma solista mulher com outro verseto do
salmo e o coro das mulheres com a resposta. Esta antifonia original,
depois de um breve período de tempo, evoluiu para a forma que todos
nós hoje conhecemos: antífona – salmo – antífona, ou seja, o
canto do salmo sem a alternância de verseto + resposta.
As
formas musicais da época do salmista são simples, quase
elementares; o mesmo vale para a sua modalidade: simples, brevidade
das peças, extensão melódica facilmente praticável, sem
modulações. Uma só dominante de composição nas antífonas, um só
tenor:
algumas antífonas com finais diferentes, uma dominante comum, o
mesmo tom salmódico.
O
que dissemos sobre a origem e evolução da salmodia encontra
confirmação nos factos musicais, que podemos alcançar nos nossos
livros de canto gregoriano, e são exatamente iguais aos do século
IX. Possuímos essencialmente a mesma matéria; nada se perdeu.
A
partir do último decénio do século V, durante o papado de Gelásio
I, papa de 492 a 496, iniciou-se a época da schola,
representada pelos géneros musicais próprios da schola.
Alguns deles obtiveram-se transformando géneros musicais previamente
existentes; outros, foram compostos de raiz.
Do
género musical da salmodia in directum, passamos à
composição dos tractos e dos cânticos,
com melodia e estrutura modal visivelmente de tipo salmódico, como
que a formar um timbre modal, e com número variável de versetos.
Do
género musical da salmodia responsorial, passamos à composição de
responsórios-graduais,
formados por apenas dois versetos: um com função de salmo
abreviado, o outro com função de responsum. Diferem
na melodia e, salvo algumas excepções, também na estrutura modal.
Fazem
parte, porém, das composições ex novo, os cantos
processionais do intróito,
do ofertório e da comunhão.
As
melodias da schola são compostas no género melódico ornado
e oferecem uma modalidade composta, que tem como lei fundamental a
presença de uma final com várias dominantes confluindo numa mesma
peça de fórmulas centonizadas
e a sucessão de vários tenores salmódicos (cf. Cânticos, Tractos
e Graduais).
Para
concluir, a história do canto gregoriano oferece-nos portanto duas
formas de salmodia (in directum e
responsorial), duas épocas de composição (do salmista e da
schola), duas fontes, dois géneros melódicos (o silábico e
o ornamentado), dois estádios de modalidade (arcaica e evoluída) e,
consequentemente, de executores (o salmista com a assembleia, e a
schola especializada).
O
livro da época do salmista é representado pelo repertório
do Antiphonale;
o livro da época da schola, pelo repertório do
Graduale.
2.
Necessidade do livro do salmista
«Para
que os fiéis participem mais activamente no culto divino, o canto
gregoriano – no quanto respeita ao povo – seja restituído ao uso
do povo. Na verdade, é absolutamente necessário que os fiéis não
assistam às funções sagradas como estranhos ou mudos espectadores,
mas, tomados verdadeiramente pela beleza da liturgia, participem nas
cerimónias sagradas [...] de modo a alternar, segundo as devidas
normas, a sua voz com a do sacerdote e da schola" (n.
IX), é o que lemos na Constituição Divini cultus sanctitatem
do Papa Pio XI, promulgada a 20 de Dezembro de 1928 aos vinte e cinco
anos do ‘Motu próprio’
de São Pio X.
Que
secção do canto gregoriano se devia devolver ao povo? Seguramente,
não o Proprium Missæ do Graduale Romanum. O povo só
poderia cantá-lo recorrendo a um tom salmódico ou mesmo ao chamado
tom recto, dada a obrigatoriedade da execução dos textos. Esta
prática executiva tornou-se habitual também para as scholæ,
seja pela sua inadequação em aprender uma parte do repertório do
Gradual – por exemplo, os Tractos e os Graduais –, seja pela
falta de tempo necessário para a preparação das peças.
Desde
o início da restauração gregoriana, sentiu-se a necessidade de
permitir que pequenas e grandes scholæ pudessem executar todo
o repertório do Gradual.
Amédée
Gastoué († 1943) publicara em 1910, para a Schola Cantorum
de Paris, uma colecção de cantos intitulada: Récitatifs en
chants simples pour Graduels, Traits, Alleluias. Os
Editores Pontifícios, Desclée & Cie, fazendo própria a
iniciativa de Gastoué, publicaram uma edição intitulada Chants
abrégés des Graduels, des Alleluias et des Traits de tout l'année
sur formules psalmodiques anciennes. Portanto, os graduais, as
Alleluia e os tractos representavam efectivamente o repertório
do Graduale Romanum mais difícil de se cantar em todas as
festividades e dias de semana, especialmente nos dos tempos fortes.
Tomo
como exemplo o Gr. Tecum princípium da missa In nocte
do Natal, na versão melódica abrégée (simplificada) pelos
editores pontifícios Desclée.
Reza o texto:
[℟]
«A ti pertence a realeza desde o dia em que nasceste: nos
esplendores da santidade, antes da aurora, como orvalho, Eu te
gerei.»
[℣]
Disse o Senhor ao meu Senhor: «Senta-te à minha direita, até que
Eu faça de teus inimigos escabelo de teus pés.»
A
forma estética de dois versetos é a mesma do Gradual. A parte
relevante é representada por um tom recitativo sobre duas cordas: o
primeiro verseto, no papel de respónsum, é recitado na corda
Ré, com acentuação em Fá (in splendoribus); o segundo
verseto (versus), ou seja, o salmo 'abreviado', é recitado na
corda Fá. A frase conclusiva deste último é retirada da fórmula
de Ré arcaico galicano. No presente gradual, é reproduzida
inteiramente a grelha modal do 2º modo do octoechos,
uma vez que o versus
do Gr. Tecum Principium (GT 42)
tem a grelha modal do «protus à
quarta», ou seja, de
um protus, com tenor em Ré e cadência final em Lá (modo
II/A, segundo a terminologia dos octoechos),
originária da tradição galicana.
Além
desta anotação, as fórmulas melismáticas são geralmente
colocadas no contexto das cadências.
Os
Tracti da edição abregée, porém, vão
cantados nos tons da salmodia silábica.
As
melodias das Alleluia limitam-se a uma única
palavra, sem o iubilus na sílaba final; enquanto os versos
são cantados nos tons semi-ornamentados do intróitos gregorianos.
Eis um exemplo de Alleluia, da Missa de Natal In
nocte:
As
melodias e fórmulas, aqui descritas, não são extraídas do
repertório gregoriano, mas principalmente do repertório milanês,
para não dar o pretexto de repetir aquela triste operação
perpetrada pela Editio medicæa de Regensburg de
1614.
A
Sagrada Congregação dos Ritos, ao tomar nota da edição dos Chants
abrégés dos Editores Pontifícios Desclée,
estabelece que os cantos nela contidos se destinam exclusivamente às
igrejas onde não é possível executar adequadamente as melodias do
Graduale Romanum, e para as quais se tolera a simples salmodia
dos textos sagrados (Carta, n. 3697).
Não
entrarei na questão da utilidade ou não desta edição nem muito
menos pretendo emitir um juízo a este respeito. Uma coisa é certa:
a simplificação das melodias, com excepção dos tons salmódicos,
não resolve o problema fundamental da participação da assembleia
nas melodias do Graduale.
As
várias formas da salmodia é que devem ser reconduzidas à época em
que os participantes na acção litúrgica tinham um papel bem
preciso. O Ordo Cantus Missae e o Lectionarium de 1970
agiram nesse sentido.
Já
vinte anos antes, em 1950, o Congresso de Roma abordara vigorosamente
o tema da necessidade de um Graduale «in usum
minorum ecclesiarum», tema já não mais adiável, à luz do
renovamento litúrgico em curso em toda a Europa (cf. De la
nécessité d'un Graduel à l'usage des petites
églises, orador Maurice Busson, in «Actes du Congrès
International de Musique Sacré», editado por Mons. Igino Anglès,
Tournai, 1052, pp. 34-36).
A
assembleia dos congressistas pronunciou-se a favor duma edição
'complementar' ao Graduale Romanum, com melodias de género
silábico, respeitadoras das formas litúrgico-musicais, e funcionais
em termos de prática executiva.
Neste
ponto, gostaria de chamar a atenção para o trabalho de Solesmes,
na preparação da edição crítica do Graduale Romanum.
Já
dois anos antes do congresso de Roma, ou seja, em 1948, se criara em
Solesmes um grupo de trabalho para lançar as bases científicas
sobre as quais se iniciaria, mais tarde, a restauração do
repertório da schola, o Graduale Romanum, ficando o
texto litúrgico crítico, sem música, dos séculos VIII-IX, a cargo
de Dom Jacques Froger († 1980), e a parte musical propriamente dita
entregue a Dom Eugène Cardine († 1988).
Nas
vésperas do Concílio Vaticano II, o grupo de trabalho, auxiliado
por alguns monges colaboradores, concluiu a preparação de milhares
de tabelas sinópticas para prosseguir com a nova edição do
Graduale Romanum.
Ao
mesmo tempo, por sua vez, Dom Jean Claire († 2006) publicou na
«Revue Grégorienne» dos anos 1961-64, os resultados de pesquisas e
estudos sobre a evolução modal nos repertórios litúrgicos
ocidentais (L'évolution modale dans les Répertoires liturgiques
occidentaux). O que Dom Claire dá a conhecer constitui o marco
graças ao qual, hoje, podemos afirmar que conhecemos tudo sobre as
formas litúrgico-musicais da antiga salmodia.
Dom
Eugène Cardine, na qualidade de secretário da Subcomissão «De
musica sacra», relata os resultados do trabalho realizado em
Solesmes, à luz dos quais se redige o texto a incluir na
Constituição Sacrosanctum Concilium: «Procure terminar-se a
edição típica dos livros de canto gregoriano; prepare-se uma
edição mais crítica dos livros já editados depois da reforma de
S. Pio X. Convirá preparar uma edição com melodias mais simples
para uso das igrejas menores» (n. 117).
Em
1964, a primeira obra do Cœtus XXV, que tinha por nome De libris
cantus liturgici revisendis et edendis, sob a presidência de Dom
Eugène Cardine, conseguiu oferecer um repertório gregoriano fácil
para as igrejas menores.
Em
1964 foi publicado o Kyriale Simplex;
em 1967, o Graduale Simplex (GS) e, um ano depois, em 1968, a
reimpressão. As duas edições do Graduale Simplex foram
reformuladas tendo em vista a editio typica altera de
1975, com o texto da neovulgata e com a inserção do Kyriale
Simplex.
3.
O Graduale Simplex da vaticana
O
repertório do Graduale Simplex da edição vaticana é
fundamentalmente um 'compêndio' do Gradual, representado por
esquemas ou formulários para os diferentes tempos litúrgicos, as
solenidades e festas, etc.. Nele encontramos, por exemplo, dois
esquemas de Proprium para o Advento, denominados «Missa I»
e «Missa II»; cinco Missæ para a Quaresma;
oito, para o tempo per annum.
Poderíamos defini-los como peças de um repertório de “Commune”
para os tempos litúrgicos e festas. Na verdade, as peças de um
determinado esquema podem ser repetidos em diversas celebrações e,
numa mesma celebração, os cantos de um esquema são intercambiáveis
com os de outro. Superando assim o critério da fixidez e imobilidade
dos textos cantados, segundo o qual estes deveriam servir para aquela
celebração específica e para aquele momento ritual específico, o
Graduale Simplex torna-se o protótipo para a liberalização
dos cantos da Missa, com texto nas ‘línguas faladas’.
Cada
esquema inclui os cantos processionais do intróito, do ofertório e
da comunhão, e os cantos das leituras nas várias formas de
salmodia.
Para
preencher os cantos processionais simples (intróito, ofertório e
communio) foram utilizadas antífonas com salmodia simples.
Não neo-antífonas, porque a composição gregoriana está
historicamente concluída; mas antífonas do repertório antigo,
autenticamente gregoriano, compostas para uma outra função, que é
a do ofício, e agora adaptadas, para uma nova função, na
celebração eucarística.
4.
O Missale Romanum, editio typica, a. 1970
A
Editio typica do Missale Romanum de 1970 traz novos
textos para os cantos processionais do intróito e da comunhão das
férias do Advento e da Páscoa. Em particular,
as
férias do Advento foram dotadas de dois conjuntos de
seis cantos cada: um para os intróitos e outro para as communio,
a serem repetidos todas as semanas. As férias de 17 a 24 de
Dezembro foram por outro lado dotadas de textos próprios;
as
férias da Páscoa, da 2ª à 6ª semana – excluindo a
oitava da Páscoa e a sétima semana de preparação para
Pentecostes – foram providas de duas séries de intróitos e
communio (A e B):
série
A, a ser repetida nas semanas II, IV, VI;
série
B, a ser repetida nas semanas III, V.
A
tabela que agora mostro mete em evidência as fontes bíblicas das
quais se extrairam os novos textos dos mencionados intróitos e
communio e em que proporção se distribuem entre eles.
Fontes
|
Advento
|
|
Páscoa
|
|
Total
|
|
Intróitos
|
Communio
|
Intróitos
|
Communio
|
|
Antigo Testamento
|
7
|
2
|
2
|
-
|
11
|
Salmos
|
3
|
1
|
3
|
-
|
7
|
Novo Testamento
|
2
|
11
|
6
|
10
|
29
|
Eclesiásticos
|
2
|
-
|
1
|
2
|
5
|
Total
|
14
|
14
|
12
|
12
|
52
|
Desta
tabela se conclui que os textos do Novo Testamento são em maior
número e frequentemente atribuídos às communio, com o
objetivo de favorecer uma estreita ligação entre as duas partes da
missa: as leituras, neste caso o Evangelho, e a Eucaristia. É um
critério de escolha aceitável. Porém, dos textos selecionados,
mais da metade são inexistentes nas fontes gregorianas do Antifonal;
os restantes apresentaram novas variantes textuais, portanto, teremos
que recorrer a outros textos comuns!
Mas
temos ainda um exemplo que se aplica ao nosso caso, nomeadamente a
série das communio das férias quaresmais, com exclusão da
5ª feira e de dois sábados, que precedem respectivamente o Domingo
I e o Domingo da Paixão. Esta série consiste nos primeiros 26
salmos do Saltério, começando na Quarta-feira de Cinzas. Veja-se o
presente prospecto.
|
Antiphonale
missarum Sextuplex (séc. VIII-IX)
|
Ps.
|
Missale
Romanum editio typica, 1970
|
Fonte
|
fr.
IV cinerum
|
Qui
meditabitur
|
1
|
Qui
meditabitur
|
Ps
1
|
fr.
VI
|
Servite
Domino
|
2
|
Vias
tuas
|
Ps
24
|
sabb.
|
(Quattuor
Tempora)
|
|
Misericordiam
volo
|
Mt
9, 13
|
fr.
II Hebd. I Quad.
|
Voce
mea
|
3
|
A.
d. v.: Quo uni
|
Mt
25, 40
|
fr.
III
|
Cum
invocarem
|
4
|
Cum
invocarem
|
Ps
4
|
fr.
IV
|
Intellege
|
5
|
Lætentur
omnes
|
Ps
5
|
fr.
VI
|
Erubescant
|
6
|
Vivo
ego
|
Ez
33, 11
|
sabb.
|
Domine
Deus meus
|
7
|
Estote
perfecti
|
Mt
5, 48
|
fr.
II Hebd II Quad.
|
Domine
Deus noster
|
8
|
Estote
misericordes
|
Lc
6, 36
|
fr.
III
|
Narrabo
|
9
|
Narrabo
|
Ps
9
|
fr.
IV
|
Iustus
Dominus
|
10
|
Filius
hominis
|
Mt
20, 28
|
fr.
VI
|
Tu
Domine
|
11
|
Dilexit
nos
|
1
Io 4, 10
|
sabb.
|
Oportet
te (filho pródigo)
|
|
Oportet
te
|
Lc
15, 32
|
fr.
II Hebd. III Quad.
|
Quis
dabit
|
13
|
Laudate
Dominum
|
Ps
116
|
fr.
III
|
Domine
quis hab.
|
14
|
Domine,
quis hab.
|
Ps
14
|
fr.
IV
|
Notas
mihi
|
15
|
Notas
mihi
|
Ps
15
|
fr.
VI
|
Qui
biberit (samaritana)
|
|
Diligere
Deum
|
Mc
12, 33
|
sabb.
|
Nemo
te cond. (adúltera)
|
|
Publicanus
|
Lc
18, 13
|
fr.
II Hebd. IV Quad.
|
Ab
occultis
|
18
|
Spiritum
meum
|
Ez
36, 27
|
fr.
III
|
Laetabimur
|
19
|
Dominus
regit me
|
Ps
22
|
fr.
IV
|
Lutum
fecit (cego de nas.)
|
|
Non
misit Deus
|
Io
3, 17
|
fr.
VI
|
Videns
Dominus (Lázaro)
|
|
In
Christo habemus
|
Eph
1, 7
|
sabb.
|
Dominus
regit me
|
22
|
Pretioso
sanguine
|
1
Petr 1, 19
|
fr.
II Hebd. V Quad.
|
Dominus
virtutum
|
23
|
Nemo
te condemnavi
|
Io
8, 10
|
Ego
sum lux
|
lo
8, 12
|
fr.
III
|
Redime
me
|
24
|
Cum
exaltatus fuero
|
Io
12, 13
|
fr.
IV
|
Lavabo
|
25
|
Transtulit
nos
|
Col
1, 13
|
fr.
VI
|
Ne
tradideris
|
26
|
lesus
peccata nostra
|
1
Petr 2, 24
|
sabb.
|
[vacat]
|
|
Traditus
est
|
Io
11, 52
|
Da série dos 26 salmos, cinco foram substituídos pelas communio
batismais e penitenciais, que passaram dos domingos para as férias.
São elas Cantabo Domino (Sl 12), Ego clamavi (Sl 16),
Dominus firmamentum meum (Sl 17). Estas três foram
transferidas respectivamente para o II, III e IV Domingos depois de
Pentecostes. Os outros dois, os Salmos 20 e 21, perderam-se.
Desconhecemos o critério de escolha o compositor para escolher o
versículo de cada salmo a atribuir a cada communio.
O Missale Romanum de 1970 substituiu a maioria dos textos
da série dos salmos por outros textos. Destes últimos, quase todos
não encontram confirmação nas fontes do Antifonal gregoriano.
Se, por um lado, a substituição dos textos do Missal, que não
se encontram nas fontes gregorianas, cria dificuldades, por outro
lado, não é de excluir a priori,
por exemplo no ofertório, o critério da escolha dos textos
per ordinem ou dos salmos ou doutros textos bíblicos.
5. A salmodia das leituras
Premissa
A salmodia responsorial adoptada pelo Ordo Lectionum Missæ de
1970 está ligada à forma de 'antifonia', na qual o salmista canta
ou proclama o verso do salmo e a assembleia responde com o refrão,
concebido já como uma verdadeira antífona. O texto da antífona
pode retirar-se do mesmo salmo, ou pode ter uma outra proveniência:
das Sagradas Escrituras, ou de produção eclesiástica, ou ainda
constituir-se por Aleluias repetidas.
Abro um breve parêntese. O Ordo Cantus Officii de 2015,
que contém os textos oficiais do Antiphonale Romanum, não
inclui a antífona composta por apenas duas Alleluia, por se
considerar incompleta. Provavelmente, para os novos liturgistas, que
pouco conhecem das tradições centenárias sedimentadas no
património musical da Igreja, a antífona para ser considerada
completa deveria ser composta por pelo menos três Aleluias.
Os cantos entre as leituras do Graduale Simplex de 1967
pertencem a um nível anterior à antifonia, baseado nas diversas
formas de salmodia, numa versão melódica na sua maioria mais
'arcaica', e que se manteve viva nas fontes manuscritas.
Coerentemente, sua classificação modal é feita segundo a
terminologia arcaica do tom modal Dó (C), Ré (D), Mi (E),
diferentemente da teoria medieval do octoechos,
aplicada às antífonas processionais dos intróito, ofertório e
comunhão.
Devemos reconhecer a riqueza litúrgico-musical do Simplex,
publicado há mais de cinquenta anos, cujo valor modal não foi
plenamente compreendido e que poderia ser chamado de “manual da
modalidade arcaica”. Na verdade, é a partir da cantilação e do
recitativo nas cordas-mãe Dó, Ré, Mi que devemos começar a
explicar o canto do Antiphonale e também
do Graduale, à luz das respectivas estrutura e
ornamentação.
A
A salmodia in
directum (Tractus)
O Graduale Simplex reconstrói a salmodia in directum
(tractus) no género silábico, sobre os tons da salmodia
simples:
Juntemos o tom da Páscoa (AR 26*).
1.
No Missale Romanum, Editio typica tertia, de 2002,
na p. 366, é usado como hino de aclamação, após a bênção da
pia batismal.
B
A salmodia aleluiática e salmodia responsorial
O tom em DÓ
a) do tom pascal simples do responsório breve (GS 61)
2.
b) e do tom da salmodia de duplo responso (GS 66);
3.
a) do tom ferial do responsório breve (GS 83),
b) do tom dominical
do responsório breve (GS 283).
O tom de
RÉ
a) do responsório breve, precedido pela terminatio
milanesa a um acento, na função de ligação melódica, com refrão
de duas Aleluias, obtido da tropatura do iubilus do verso
Dirigatur (GS 408);
b) da melodia do Ite missa est. Alleluia do dia de Páscoa
(GS 147).
O tenor Sol é a transposição da corda-mãe Ré. A subida
ao Dó da resposta de uma única Alleluia
representa o último estádio de oscilação melódica entre o si
bemol e o si bequadro, e é um prelúdio para um futuro tenor em Dó.
a) com o refrão sálmico, obtido através da silabificação do
iubilus do verso Dirigatur e precedido pela terminatio
milanesa (GS 71);
e Gelásio
I, papa de 492 a 496, iniciou-se a época da schola,
representada pelos géneros musicais próprios da schola.
Alguns deles obtiveram-se transformando géneros musicais previamente
existentes; outros, foram compostos de raiz.
Do
género musical da salmodia in directum, passamos à
composição dos tractos e dos cânticos,
com melodia e estrutura modal visivelmente de tipo salmódico, como
que a formar um timbre modal, e com número variável de versetos.
Do
género musical da salmodia responsorial, passamos à composição de
responsórios-graduais,
formados por apenas dois versetos: um com função de salmo
abreviado, o outro com função de responsum. Diferem
na melodia e, salvo algumas excepções, também na estrutura modal.
Fazem
parte, porém, das composições ex novo, os cantos
processionais do intróito,
do ofertório e da comunhão.
As
melodias da schola são compostas no género melódico ornado
e oferecem uma modalidade composta, que tem como lei fundamental a
presença de uma final com várias dominantes confluindo numa mesma
peça de fórmulas centonizadas
e a sucessão de vários tenores salmódicos (cf. Cânticos, Tractos
e Graduais).
Para
concluir, a história do canto gregoriano oferece-nos portanto duas
formas de salmodia (in directum e
responsorial), duas épocas de composição (do salmista e da
schola), duas fontes, dois géneros melódicos (o silábico e
o ornamentado), dois estádios de modalidade (arcaica e evoluída) e,
consequentemente, de executores (o salmista com a assembleia, e a
schola especializada).
O
livro da época do salmista é representado pelo repertório
do Antiphonale;
o livro da época da schola, pelo repertório do
Graduale.
2.
Necessidade do livro do salmista
«Para
que os fiéis participem mais activamente no culto divino, o canto
gregoriano – no quanto respeita ao povo – seja restituído ao uso
do povo. Na verdade, é absolutamente necessário que os fiéis não
assistam às funções sagradas como estranhos ou mudos espectadores,
mas, tomados verdadeiramente pela beleza da liturgia, participem nas
cerimónias sagradas [...] de modo a alternar, segundo as devidas
normas, a sua voz com a do sacerdote e da schola" (n.
IX), é o que lemos na Constituição Divini cultus sanctitatem
do Papa Pio XI, promulgada a 20 de Dezembro de 1928 aos vinte e cinco
anos do ‘Motu próprio’
de São Pio X.
Que
secção do canto gregoriano se devia devolver ao povo? Seguramente,
não o Proprium Missæ do Graduale Romanum. O povo só
poderia cantá-lo recorrendo a um tom salmódico ou mesmo ao chamado
tom recto, dada a obrigatoriedade da execução dos textos. Esta
prática executiva tornou-se habitual também para as scholæ,
seja pela sua inadequação em aprender uma parte do repertório do
Gradual – por exemplo, os Tractos e os Graduais –, seja pela
falta de tempo necessário para a preparação das peças.
Desde
o início da restauração gregoriana, sentiu-se a necessidade de
permitir que pequenas e grandes scholæ pudessem executar todo
o repertório do Gradual.
Amédée
Gastoué († 1943) publicara em 1910, para a Schola Cantorum
de Paris, uma colecção de cantos intitulada: Récitatifs en
chants simples pour Graduels, Traits, Alleluias. Os
Editores Pontifícios, Desclée & Cie, fazendo própria a
iniciativa de Gastoué, publicaram uma edição intitulada Chants
abrégés des Graduels, des Alleluias et des Traits de tout l'année
sur formules psalmodiques anciennes. Portanto, os graduais, as
Alleluia e os tractos representavam efectivamente o repertório
do Graduale Romanum mais difícil de se cantar em todas as
festividades e dias de semana, especialmente nos dos tempos fortes.
Tomo
como exemplo o Gr. Tecum princípium da missa In nocte
do Natal, na versão melódica abrégée (simplificada) pelos
editores pontifícios Desclée.
b) com o refrão baseado na célula-mãe do modo de Ré
(ré-dó-ré-mi-mi-re), precedido pela terminatio acentuada,
com a nota final descendo para a subtónica Dó (GS 98).
[O presente refrão encontra-se na litania Agnus Dei XII
(GT 754.2)];
c) na estrutura modal do refrão do Resp. Ego dixi,
precedido da terminatio a um acento, como o tom precedente (GS
92);
d) no tom do verso Dirigatur (GS 144).
O GS classifica o presente e tom em C* devido ao tenor
evoluído em Dó. O tenor original do verso Dirigatur é Ré
(= Lá, na escrita actual), em uníssono com a nota final do iubilus.
O tom de Mi
a) no timbre modal milanês das antífonas após o Evangelho, em
modalidade arcaica, com a resposta de duas Aleluias (GS 370);
b) no timbre milanês da ant. Omnes angeli eius, mas com
tenor evoluído em Sol e resposta de duas Aleluias (GS 217);
c) no modo arcaico de Mi que, posteriormente, evoluiu para o tenor
em Sol (segunda parte do verseto) e Lá (primeira parte do verseto),
com a ornamentação do Si natural (GS 179).
O ℣ 1. do presente
tipo modal, de origem romana, está numa modalidade arcaica, com a
resposta de duas Aleluias. O ℣2, para alternar com o anterior, foi acrescentado mais tarde, quando
este tom foi transplantado para o Norte da Europa. A sua datação
tardia é evidente não só pela evolução do tenor para Sol e Lá,
mas também pela resposta, à qual foi acrescentado uma terceira
Aleluia no início.
O sinal de asterisco antes da clivis é exigido pela restituição,
à luz das fontes manuscritas.
C
Disposição da salmodia entre as leituras
A disposição litúrgica dos cânticos entre as leituras é a
seguinte:
com duas leituras antes do evangelho: após a primeira
leitura (vetero-testamentária), realiza-se o salmo responsorial;
após a segunda leitura (neo-testamentária), o salmo aleluiático
ou, na Quaresma, o salmo in directum;
com apenas uma leitura antes do evangelho, escolhe-se ad
libitum uma das duas opções precedentes.
É o que estava previsto no Graduale Simplex elaborado pelo
Cœtus XXV, De libris
cantus liturgici revisendis et edendis, cujos presidente era Dom
Eugène Cardine e secretário Dom Luigi Augustoni. Os membros eram:
Dom Jacques Hourlier e Dom Jean Claire de Solesmes, Pe. Miguel
Altisent, piarista (Catalunha), Pe. Lucas Kunz OSB, de Gerleve
(Alemanha) e Pe. Jeapontificio istituto di musican Harmel, premonstratense de Mondaye.
Infelizmente, uma mão estranha ao Cœtus
XXV, mas certamente do Cœtus
XXX, que tinha a tarefa de fazer uma revisão geral a todas as
edições pós-conciliares, introduziu uma antífona de aclamação,
composta de Aleluias repetidas mais o verseto nos oito tons, à moda
das antífonas processionais de entrada, ofertório e communio.
A versão melódica da Aleluia não pertence ao velho fundo
gregoriano, mas segue o modelo das antífonas do ofício ferial. Eis
um exemplo de Alleluia (GS 250) com a melodia da
ant. Deo nostro (GS 241).
Aliás, o percurso do Graduale Simplex foi difícil: até o
termo “salmista” teve que ser substituído pelo de “cantor”.
Após essa intrusão, os cantos entre as leituras foram dispostos
do seguinte modo (GS 54):
quando há duas leituras antes do evangelho, os cânticos
distribuem-se assim: após a primeira leitura, canta-se o salmo
responsorial; depois da outra leitura, ou o salmo aleluiático, ou a
antífona Alleluia com seus versos;
todas as outras vezes, com apenas uma leitura antes do
evangelho, executa-se apenas um dos cânticos citados, ad
libitum.
Destaco que a rubrica fala de Alleluia com
múltiplos versos; não com apenas um.
6. O canto gregoriano, hoje
Uma das disposições inovadoras do Concílio Vaticano II em
matéria litúrgica foi a admissão de línguas vivas e faladas nas
celebrações (SC 54). Como resultado, o canto gregoriano, pelo facto
de estar intimamente ligado à língua latina, sofreu uma forte
recessão, embora o latim continue a ser a língua oficial da Igreja
para comunicar "na verdade" com todas as línguas nacionais
espalhadas pelo mundo. A causa do retrocesso do canto gregoriano não
deve ser atribuída ao Concílio Vaticano II: «A Igreja reconhece
como canto próprio da liturgia romana o canto gregoriano», afirma o
n. 116 da Constituição Sacrosanctum Concilium; «terá este,
por isso, na acção litúrgica, em igualdade de circunstâncias, o
primeiro lugar.»
O Concílio Vaticano II, acolhendo os pedidos para oferecer à
Igreja universal uma nova estação da liturgia, foi muito além da
questão do uso das línguas nacionais; inaugurou um “novo” Ordo
Missæ et Officii, no qual o carácter comunitário
de cada celebração litúrgica é plenamente revalorizado e
inculcada a participação activa de cada agente litúrgico e em
particular dos fiéis.
A Instrução da Sagrada Congregação dos Ritos sobre a música
na sagrada liturgia, a. 1967, preparada em nome de São Paulo VI,
pelo Consilium para a aplicação da Constituição Litúrgica
Sacrosanctum Concilium do Vaticano II, dedica particular
atenção ao ofício litúrgico dos fiéis (n. 15) e oferece uma
série de indicações práticas que esgotam quase todas as situações
problemáticas relativas às tarefas de todos os actores da
celebração.
Que partes da Missa devem ser confiadas ao povo? As respostas ao
celebrante e aos ministros, as aclamações e a resposta em forma de
refrão ao salmo responsorial, que são de direito e de obrigação
(n. 16 a, 7, 19), porque ninguém pode ser representado por outros na
sua oração pessoal de fé e na sua adesão aos mistérios de Cristo
que por ele são celebrados, assim como ninguém pode pensar em
enviar outro à mesa eucarística em seu lugar.
Hoje, encontramo-nos em plena crise da música sacra! Não devemos
resignar-nos! Devemos regressar humildemente às fontes do canto da
Igreja, onde se encontram aquelas melodias que pressupõem a
participação de quantos intervêm nas sinaxes litúrgicas. Estas
melodias, embora não apareçam em documentos até o século IX, são
capazes de revelar algo sobre o seu passado. O Graduale Simplex
da Vaticana recolheu esta herança, selecionando géneros musicais
simples e idóneos a uma participação directa da assembleia.
O que hoje é importante é assegurar ao canto gregoriano a
“liberdade de oração cantada da Igreja”. Liberdade de oração
cantada, em comentar um texto, em realçar os seus detalhes; em
traduzi-lo melodicamente, permitindo que a doutrina que ele contém
seja maiormente assimilada; em reduzir o texto ao mínimo (iubilus),
em deixar a alma inebriar-se na oração sem lhe impor nenhum
conceito intelectual. E por isso é importante saber o que o
compositor quis exprimir, conhecer o seu discurso musical, tal como o
escreveu, de modo a produzir em nós o efeito que se espera:
«attentio ad verbum, ad sensum, ad Deum».
Aqui passamos diretamente do «verbum ad Deum».
O canto gregoriano produzirá o seu efeito, transmitirá a sua
mensagem, apenas sob determinadas condições, algumas das quais são
de natureza objectiva e visam torná-lo plenamente ele mesmo; outras
são de natureza subjectiva e dizem respeito aos participantes do
culto divino.
Condições objectivas
É necessário que o canto da Igreja seja plenamente ele mesmo,
isto é, que seja autêntico e que, na sua execução, responda ao
pensamento do compositor.
No entanto, o valor das melodias gregorianas é tal que, apesar
das corrupções progressivas que ao longo dos séculos afectaram a
sua pureza originária, apesar também da escassa qualidade da
execução, a sua beleza, o seu poder explicativo do texto, o seu
conteúdo religioso, dificilmente se conseguem anular.
A segunda condição objectiva que torna canto gregoriano nele
mesmo é a sua execução: a perfeição, que pressupõe no
intérprete as qualidades correspondentes àquelas que a análise das
melodias revelou; a técnica impecável, a expressividade humilde e
contemplativa; a submissão a todas as nuances sugeridas pelo texto
litúrgico e a sua notação musical.
Alguns acreditam que esta exigência de perfeição tende a
transformar a assembleia litúrgica num encontro cultural. A
assembleia, entendida como o povo que participa na liturgia, é um
dos actores da celebração. Primeiro e mais importante que isto, há
o celebrante e os ministros, entre os quais o salmista, em diálogo
com a assembleia. Portanto, para além dos recitativos e da salmodia
nas formas originais, o canto gregoriano foi composto para ser
ouvido.
Não devemos então esperar perfeição de execução por parte da
assembleia, mas da schola; de uma schola, que não
deverá propôr cantos acima das suas próprias competência e
musicalidade.
Concretamente, devemos libertar-nos da moda de que a aprendizagem
da arte gregoriana se esgote no conhecimento dos elementos gerais da
notação. O que se fez com zelo quase destemperado no início do
século passado para reintroduzir o canto gregoriano em todos os
níveis de celebração e em todos os lugares deve ser avaliado com
as devidas distinções: era de qualidade insatisfatória, para dizer
o mínimo; teve uma execução baseada em métodos imaturos e
superficiais, sem qualquer atenção à 'palavra cantada'.
Condições subjectivas
Uma vez assegurada a forma autêntica do canto gregoriano (melodia
e execução), o tema muda para como usá-lo correctamente.
O canto gregoriano é, antes de mais, «oração». De qualquer
ângulo que se aborde o gregoriano, nunca se deve esquecer a sua
conotação essencial de «oração cantada». A característica
desta oração cantada reside na sua profunda religiosidade. Não só
porque encarna ritos religiosos, como são os da liturgia, mas também
porque a sua expressão verbo-melódica amadureceu tanto através de
uma espiritualidade profunda como de uma experiência vocal
consumada. Escreve Dom Jean Claire, celebrando a memória de Dom
Eugène Cardine: «A música contemporânea não prepara em nada para
cantar a palavra, a frase de forma natural, nem para dosear a síntese
viva das duas com facilidade e naturalidade, mantendo a todo o
momento um olho na palavra e outro na frase" (cf. J. CLAIRE, Dom
Eugène Cardine, em «Études Grègoriennes», XXIII, 1989, p. 22).
O canto gregoriano é a oração do compositor, para se tornar a
oração do maestro, da schola e do povo dos redimidos. Se a
análise das melodias, a observância das regras, o cuidado na
tradução das nuances e da expressão absorverem os intérpretes, o
canto conservará ainda um valor religioso, de intenção, de
oferenda, de mostrar e amplificar o conteúdo dos textos cantado.
Alberto Turco
Professor Emérito de Canto Gregoriano
no
Pontifício Instituto de Música Sacra, Roma
Festa de São Bento Abade, 11 de julho de 2023